9.3.07

Cap 8: O mundo dos loucos

_ O que ele está fazendo ali?_ Angélica perguntou a Anderson, assim que entrou no grande salão, onde eles ensaiavam. Encontrou o rapaz sentado na poltrona lendo os scripts da peça.
_Ele?_ Anderson olhou para Daniel no fundo do palco, sozinho em uma cadeira.
_Ainda não foi descoberto muito sobre o mundo dos loucos ainda._ fez pouco caso e continuou a fixar sua atenção no papel.
_Eu tinha que falar com ele sobre essas contas aqui para pagar... Será que vou interromper alguma coisa?_ pediu o conselho.
_Sinceramente? Acho melhor vir depois, quando Daniel fica assim é bom nem chegar perto.
_Tudo bem..._ Angélica suspirou olhando para os boletos de pagamento. Decidiu retornar para o escritório. Estava terminando de digitalizar o cadastro dos alunos das outras aulas e ainda precisava fazer contabilizar os pagamentos.
Foi em meio aos papéis, calculadora e muitas anotações, que Daniel a encontrou duas horas depois. Sentou-se na cadeira e ficou olhando-a trabalhar.
_Eu tenho umas coisas que preciso que veja..._ Angélica separou algumas folhas.
_Patrícia não vai se recuperar a tempo. Vai precisar operar..._ Daniel anunciou e aquilo se tornou o mais importante naquele instante. Angélica entendeu agora seu momento de reflexão no palco.
_Lamento. E o que vai fazer?_ perguntou.
_Já sei quem vai substituí-la. Está tudo certo.
_Já?_ Angélica ao mesmo tempo que ficou surpresa, sentiu um alívio por ele ter desistido da idéia de contar com ela para o papel da atriz principal.
_Mas enquanto ela não chega, eu não posso parar o trabalho com os outros, preciso decorar o texto, arrumar as posições no palco... Por isso, eu vou aceitar a sua ajuda para memorizar as falas. Você fica conferindo no papel se a gente está passando tudo direito. Pode ser?
_Pode, claro. Vai dar tudo certo._ Angélica sorriu e se prontificou a auxiliá-los.
_Então, ótimo. Você cuida de tudo aqui de manhã e na parte da tarde a gente ensaia. Você poderia ser minha assistente.
_Com certeza!_ ela gostou da idéia, quanto mais Daniel precisasse dela, mais garantido estaria seu emprego e o sustento de Rique, que já começara a estudar.

...

Taieko, Felipe e Anderson já estavam no palco, quando Daniel chegou com Angélica. Ele explicou qual seria a função dela nos ensaios e todos concordaram plenamente com um consentimento de cabeça.
_Ela também vai ganhar um diário?_ Anderson riu.
_Do que ele está falando...?_ Angélica perguntou para Daniel.
_Ah! Depois eu te falo..._ Daniel fez pouco caso. _ Imprimi um roteiro para você. Sublinha as falas da Catarina com essa caneta aqui. _ Ele pediu.
_Tudo bem..._ Angélica subiu pela escada lateral do palco e sentou-se em uma cadeira que havia no centro.
Enquanto os outros combinavam baixinho onde ficariam em cada ato, ela se sentiu sozinha, voltando ao passado. Ouviu palmas, muitas palmas. Balançou a cabeça para o lado, não iria lembrar de nada daquilo mais. Precisava sublinhar, essa era sua tarefa.

O primeiro dia foi tranqüilo, apenas repassaram as falas e cuidaram de alguns detalhes. Após todos se despedirem, restou Angélica e Daniel.

_Quero te dar uma coisa..._ ele pulou do palco e foi até um armário de duas portas que ficava ao lado da mesa com o aparelho de som.
_Me deixou curiosa._ Angélica desceu pela escada lateral e foi ao seu encontro.
_No dia da estréia, daremos de brinde para os convidados._ Daniel retirou do saco um pequeno caderno de capa dura onde havia um adesivo com a inscrição “Diário de uma mulher de família”._ Todos da peça temos o nosso. Isso ajuda a entrar melhor o mundo da personagem principal. É o que chamamos de um laboratório.
_Hum, sim. Bonito._ ela elogiou.
_Eu queria que você fizesse as anotações que eu falar. Sobre marcações, figurinos e todos os detalhes.
_Aqui no diário?_ Angélica tentava descobrir o sentindo de ter ganho aquele caderno, afinal de contas, ela não era atriz e, por tanto, não precisava do que ele estava chamando de “laboratório”.
_Não. Isso você vai anotar em outro lugar. Procure um caderno no escritório. Esse aqui é para você escrever o que quiser. Eu não disse o que você viver, como um diário comum, mas o que quiser, as fantasias, as imaginações, as mentiras...
_Eu não minto._ ela corrigiu._ Eu sou uma mulher da igreja._ lembrou-o._ Eu busco a santidade.
_E o que é verdade?_ Daniel perguntou.
_..._ Angélica ficou sem saber o que responder por um tempo. _ É o que eu acredito.
_ E quem te ensinou o que você acredita?
_O que importa é que eu acredito e ponto.
_Claro, escreva isso, então, mesmo que seja sua primeira mentira._ Piscou o olho e abaixou-se para colocar suas coisas dentro da mochila.
Ela franziu a testa e fez uma cara de interrogação. Achou que Anderson estava certo: Daniel era um louco. Mas não importava, ele pagava seu salário.

Eliane

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